DayMare 1998 | É jogo que busca identidade reconhecimento ao homenagear Resident Evil e o gênero survival Horror

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Categoria: Review

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Quando uma poderosa indústria farmacêutica com ampla aceitação do mercado começa a desenvolver experimentos genéticos de forma secreta na mansão Spencer, a pequena Racoon City não imaginaria que seria palco de um surto epidêmico que abalaria toda a estrutura da América do Norte.

Inspirações em Resident Evil

Tomada pela infestação caótica de mortos vivos que se espalhavam como uma praga, unidades policiais de alto escalão foram recrutadas para investigar a situação e encontraram neste cenário de desolação intenções ambiciosas fortemente voltadas para uma guerra biológica.

A luta contra a gigante corporação tem início por parte de alguns agentes, mas é sufocada por forças políticas e militares superiores transformando o episódio ocorrido na cidade de Racoon em uma história contornável e sob controle deixando aqueles que a conhecem a verdadeira origem em uma posição de isolamento e sem credibilidade.

Com um enredo apoiado em eventos sociais sinistros em um ambiente de terror com criaturas anormais, Resident Evil conquistou o título de uma das maiores franquias de jogos eletrônicos da história do entretenimento. Em vinte e quatro anos de existência, a série entregou personagens cativantes, sete títulos principais e diversos spin-offs que contaram como a liberação de um vírus passou de um caso local a interesses milionários.

A cada jogo lançado, a franquia ganhava uma base de fãs cada vez mais sólida e fiel ao nome Resident Evil que permitiu que a empresa desenvolvedora Capcom ficasse mais próxima dos jogadores e obtivesse deles o feedback necessário para manter o título com qualidade ao mesmo tempo que continuava sendo desejado pelo público.
Entretanto, mesmo tendo a opinião constante dos fãs, a série passou por períodos críticos entregando uma experiência de jogo considerada desvirtuada pelos especialistas com jogos distantes da proposta original fruto de um posicionamento ambicioso por parte da Capcom.

Em 2015, quando a franquia estava próxima de completar vinte anos, os jogadores esperavam um anúncio da empresa japonesa para a comemoração da data, mas a reposta foi morna com apenas alguns títulos sendo remasterizados para os consoles de atual geração no ano seguinte. Entretanto, ainda no mesmo ano, foi anunciado publicamente o “remake” de Resident Evil 2, um dos capítulos mais adorados e que foi recebido com muito entusiasmo levando três anos para ser concluído.

A principal estratégia para assegurar qualidade de um jogo prestigiado por público e crítica foi chamar programadores e design de games assíduos ao game que trabalhavam de forma independente em uma reimaginação para Resident Evil 2. Intitulado Resident Evil: Reborn, a produção ganhava popularidade na internet com milhões de visualizações em apenas uma semana sendo aguardado ansiosamente pelos fãs que queriam um retorno em grande estilo. O projeto foi vetado pela própria Capcom, mas com boas intenções uma vez que os envolvidos foram contratados pela empresa para desenvolver a versão oficial do jogo.

De produtores independentes a funcionários de uma famosa empresa de jogos, a equipe que encabeçou o “remake” fundaria tempos depois um time próprio sendo conhecido como Invaders Studios. Após a grande empreitada com Resident Evil, os produtores do novo estúdio estavam prontos para lançarem um título com o próprio selo baseado em todo know how adquirido. Em um misto de tributo e busca pela própria identidade, o estúdio italiano lança em 2020 seu primeiro grande título original: DayMare 1998.

Tributo a um grande clássico

Tendo o survival horror como elemento principal de gameplay, a proposta do jogo é um grande tributo a Resident Evil tendo em sua composição um leque vasto de referência ao título original que vai desde ambientes famosos como o hospital de Resident Evil 3, o estacionamento da delegacia de Racoon City até salas e corredores diretamente inspirados da franquia da Capcom.

Neste sentindo, é possível afirmar que o time da Invader Studios fez um trabalho competente provando que mais do que fãs de jogos de terror, a equipe entende de Resident Evil reproduzindo com muita fidelidade aspectos que consagraram o game. Daymare 1998 se esforça para ser uma homenagem e não um clone barato que busca se consagrar sendo que os detalhes de referência de diversos capítulos mostram que a desenvolvedora mantém carinho e respeito pela sua fonte inspiradora.

A história é baseada no mesmo surto biológico que transformou Resident Evil em uma história de sucesso. O laboratório de biogenética Hexacore sofreu um acidente que espalhou um vírus contagioso entre os funcionários e, como medida de segurança, adotou a quarentena para evitar o risco de um contágio em massa.

Horas depois do contato do laboratório com as autoridades responsáveis, o esquadrão de elite H.A.D.E.S(Hexacore Advanced Division for Extraction and Search) foi designado ao local para checar a situação e recolher uma amostra do conteúdo genético. Ao chegarem ao laboratório, o agente Liev encontrara uma zona morta e os poucos sobreviventes tinha se tornado mortos vivos com anomalias grotescas. Ao explorar a instalação da Hexacore, ele encontra experimentos genéticos inéditos que poderiam iniciar uma guerra biológica ao mesmo tempo que criaturas superpoderosas tentam impedir sua saída.

O que deveria ser uma missão bem-sucedida se tonou um jogo de interesses e de poder com intenções misteriosas e com pouco tempo para se descobrir a verdade. Após o esquadrão de agentes especiais saírem do local, rancores do passado e a competição pelo poder fazem Liev fugir fazendo o enredo ganhar novas proporções que modificarão os rumos do surto.

Deslizes Técnicos

A pequena cidade de Keen Sight é tomada pelo agente patológico incitando o perigo biológico e aniquilando toda a sociedade. Enquanto Liev e Sandman travam uma intensa batalha por motivos pouco conhecidos, Sam Walker, um vigilante florestal, entra em cena como um dos protagonistas se envolvendo na trama por consequência de atitudes que não estavam sobre seu controle.

DayMare 1998 traz a todo momento uma atmosfera sombria em que o terror do desconhecido pode estar em qualquer canto já que o surto aconteceu há pouco tempo e ninguém sabe ao certo como proceder. Mantendo a linha de survival horror com semelhanças extraídas direto de Resident Evil, o jogo faz uma tentativa de inserir o jogador em uma ambientação sinistra através de recursos como jogabilidade, gráficos e trilha sonora. Entretanto, os aspectos técnicos de DayMare são falhos por ainda estarem pouco polidos e afetam diretamente a jogabilidade principalmente no combate a inimigos mais fortes.

A visão está representada em terceira pessoa com a câmera fixada nos ombros do personagem, o que confere estabilidade na percepção dos cenários. As repostas aos comandos sofrem com a lentidão para serem executados fazendo com que simples ações como recarregar a arma ou usar itens de cura devam ser planejados com antecedência.

Cada personagem tem a opção de andar e correr sendo possível executar o controle do giro da câmera, mas ao passar por corredores apertados ou correr por espaços amplos, é possível notar o ângulo de visão sendo “puxado” para o lado desalinhando o centro. Quando um inimigo ataca, a visão se aproxima com o intuito de mostrar o esquema de defesa, mas após o contra-ataque, a câmera se perde fazendo o jogador confundir o caminho.

O sistema de tiro que é o principal ponto da jogabilidade é construída também com base no sistema de Resident Evil, porém sofre com padrões confusos e de pouco assertividade que atrapalha as partidas e causa morte desnecessárias aos personagens.

O conceito de mirar, atirar e recarregar é uma tentativa de um esquema funcional, mas que não cumpre completamente o objetivo de defesa. A mira conta com um retículo na tela e funciona de forma razoável deixando a regulagem livre para acertar diferentes partes dos corpos dos zumbis. É possível optar pela mira automática, mas esta opção não se reflete em benefícios em momentos de maior perigo ou durante um número maior de inimigos.

Em relação às armas, o jogo oferece um arsenal padrão típico de jogos do gênero que incluem desde uma pistola 9M, a famosa Shotgun e a Magnum com desempenho que se reflete no combate aos oponentes fazendo com que a escolha da arma certa na hora certa seja uma estratégia de sobrevivência. A sensação do tiro representada pelo movimento das armas, pelo impacto no inimigo e pela sonoplastia característica é um fator pouco trabalhado no título. Ao acertar uma das criaturas que aparecem pelo caminho, é comum ocorrerem atrasos no processamento de dados resultando em um disparo graficamente mal configurado e com lags além de atraso no som do tiro gerando a sensação de atirar balas de borracha em alvos de plástico.

Apesar de se passar em um momento de surto biológico, o jogo não oferece variedade expressiva de inimigos limitando-se à repetição dos zumbis tradicionais e das criaturas mais violentas como o homem derretido que exige mais tempo e munição para serem abatidos. Os modelos de zumbis são os mesmos nos diferentes capítulos e seguem uma tendência presente em jogos desse gênero tirando um pouco a ideia de realidade de contágio.

O carregamento de armas é o fator mais complicado da jogabilidade de DayMare 1998 por trazer um sistema pouco útil que atrapalha o andamento dos objetivos. Ao recarregar uma arma, o pente substituído é lançado ao chão permitindo que seja recuperado para novo uso. O problema desse sistema é que é necessário recarregar o pente de forma manual através do menu com o jogo ainda em andamento sendo possível aos inimigos acertarem o personagem. A recarga nem sempre funciona de forma automática e conta com uma opção de um slot de recarga rápida que também é pouco funcional e não otimiza um elemento tido como básico em jogos que priorizam o tiro e que dever ser sempre polido tecnicamente para não gerar perda de gameplay
Quando a munição se esgota, o personagem não carrega a arma imediatamente mesmo havendo balas disponíveis no inventário sendo necessário usar de outro armamento para superar um obstáculo. Ao enfrentar criaturas mais fortes em momentos chaves do jogo, recarregar a arma ou trocar por outra que contenha munição é uma tarefa lenta que geralmente resulta em morte por falta de precisão em aspectos técnicos.

O menu de opções oferecido pelo jogo é mostrado pelo palm top e contém informações como inventário, saúde, mapa e arquivos recolhidos. Apesar de parecer uma boa ferramenta a princípio, o dispositivo é igualmente lento e, quando em uso, o jogo não é pausado transformando a organização da rotina em um perigoso descuido.

Ao escolher determinadas configurações para os comandos, a Invader Studios buscou trazer aspectos verossímeis que estivessem próximos da realidade objetivando uma inovação na jogabilidade que não atendeu às condições do gênero survival horror. Mesmo sendo possível adaptar-se aos padrões definidos pela desenvolvedora, a reposta dos comandos não se torna melhor com a prática de jogo sendo um fator contornável até certo ponto, mas falho na maioria das vezes.

Se a função de mirar, atirar e recarregar apresenta falhas consideráveis, um outro elemento do fator jogabilidade ganha destaque pela originalidade e objetividade: os puzzles. A atual geração de jogos conta com quebra cabeças simplistas que servem para oferecer algum grau de dinamicidade ao jogo, porém estão longe de serem efetivos e causar o efeito de estagnação que é próprio de um puzzle bem montado.

Neste quesito, o game vai além de uma homenagem e entrega uma experiência legítima que agrega identidade ao trazer um momento de novidade combinado com tributo.Os desafios propostos seguem o formato de base de Resident Evil e acontecem em momentos específicos da fase longe de inimigos e perigo. No entanto, o que poderia ser um alívio para o jogador pode se transformar em uma experiência que vai exigir paciência e um pouco de pensamento lógico para avançar na história. Os quebra cabeças aparecem em diferentes níveis de dificuldade e engenhosidade cujas dicas vão revelar somente o básico deixando o trabalho de solução para o jogador. A exemplo, pode-se citar final do primeiro capítulo em que o agente Liev deve reiniciar o sistema de segurança do laboratório através do computador da sala do diretor. Tal sistema exige a inserção de três nomes de deuses da mitologia grega cujos quadros com suas respectivas representações estão disponíveis no corredor do saguão principal. Além de compreender a qual divindade o sistema se refere, é necessário digitar o nome em grego usado para isso o alfabeto da língua que não conta com a maioria das vogais românicas fazendo com que o jogador entenda minimamente a estrutura do idioma.

Um jogo de horror de sobrevivência é intimamente ligado a um visual escuro com lugares abandonados causando uma sensação de abandono permanente graças aos elementos gráficos que imprimem um vazio de vida ao redor. Jogos Como Silent Hill e Outlast lançam mão dessa ferramenta poderosa para gerar tensão e sustos reais nos jogadores que se deixam levar por cores e formas propositalmente pensadas para o terror.

Em DayMare 1998, o level design é uma remontagem de cenários de quase todos os capítulos de Resident Evil que se mostra competente em promover ambientes interessantes de serem explorados. A tensão é construída progressivamente conforme se avança nos objetivos, mas muitas vezes quebrada por um visual gráfico com sinais perceptíveis de desgaste não explorando todo o potencial do UnReal Engine 4.

Oscilação é a palavra de ordem no jogo que apresenta variação de texturas, definição e renderização dependendo de que ângulo a cena é mostrada. Os ambientes fechados são pensados para serem claustrofóbicos e com o intuito de provocar desconforto a cada virada de corredor. Ao caminhar por um mesmo cenário várias vezes, é possível ver objetos, paredes e móveis em boa resolução ao mesmo tempo que quando verificadas de um outro ângulo estão borradas e com cores opacas. O mesmo acontece com os zumbis que, quando distantes, possuem um visual poligonal serrilhado com cores falhas ao passo que quando próximos, mostram detalhamento que vai desde hematomas a tonalidade de pele mais escuras característicos de mortos vivos.
A definições e expressões faciais são de baixa qualidade e sem realismo sendo semelhantes ao jogo Dead Island (Deep Silver) de 2011 que também passava por esse processo de oscilação. A definição e renderização das expressões dos personagens são falhas com um design ocular quase estático e sincronização labial pouco eficiente que afeta o visual do game como um todo visto que o motor gráfico utilizado já superou falhas desse tipo de configuração gráfica há um bom tempo.

Em contrapartida, os efeitos de luminosidade são efetivos e bonitos e contribuem para amenizar os demais aspectos gráficos cumprindo satisfatoriamente as condições propostas nos ambientes de jogo. A claridade da iluminação e seu reflexo em objetos, pisos ou mesmo nas criaturas a serem combatidas transmite realidade ao tocarem as diferentes escalas de cores que ganham vida como é o caso da lanterna dos personagens que ilumina focos específicos. Os efeitos de luz e sombra são o que o jogo tem de melhor na parte gráfica e se destaca em muitos momentos como, por exemplo, na estrada de terra atrás da casa de Sam Walker iluminada por postes onde é possível perceber as variações de tons mais claros e escuros que criam um ambiente de tensão e medo a medida que os zumbis caminham em sua direção.

No entanto, somente efeitos de luminosidade não compõe o gráfico de um jogo deste estilo e precisa estar harmonizado com o layout, level design e proposta de gênero como é o caso de um survival horror.

Trilha Sonora

A trilha sonora é um dos fatores técnicos mais relevantes para um jogo de terror e, no caso de DayMare 1998, existe uma forte tentativa de aliar música e terror em momentos precisos, mas assim como a parte gráfica, a composição da trilha apresenta alguns descompassos na execução fazendo com que a sensação de medo não seja completa.

A música do jogo conta com composições caprichadas que vão desde momentos de mais controle com acordes de violão até a tensão máxima com graves batidas de tambores e violinos ruidosos que causam arrepios e aceleração cardíaca. Os efeitos de sonoplastia são adequados as diferentes situações incluindo os grunhidos dos zumbis, os ecos dos passos dos personagens em ambientes fechados e o ruído dos itens carregados que balançam no corpo. Vale destacar que o silêncio que se manifesta durante o jogo também compõe a trilha sonora contribuindo para a sensação de mistério e incertezas provenientes de uma condição inesperada e que afeta a todos sendo uma característica sonora fundamental para a imersão no jogo.

Em termos sonoros, o título busca manter a qualidade de Resident Evil com pequenas diferenças na proposta, mas com um recorrente desencaixe na execução. Isso porque os efeitos sonoros às vezes não acontecem no momento exato como é o caso da música de combate que, em determinadas situações, não aparece ao enfrentar o um zumbi, mas eleva-se em momentos de exploração ou retorno às áreas já investigadas que desperta a sensação de perigo iminente sem necessidade aparente.

O maior deslize da parte sonora do jogo da Invader Studios é a dublagem que soa pouco convincente e não caracteriza seus personagens de forma a construir uma identidade própria fazendo dos protagonistas pessoas pouco memoráveis que não causam empatia, afeição e relação identitária duradoura. Parte do grande sucesso de Resident Evil se deu pela construção de fortes personagens com caráter expressivo que, alinhados à história, ganharam relevância e o gosto do público sendo sempre lembrados e requisitados para um novo capítulo.

Veredito

De forma geral, o game mostra mais problemas na execução e processamento das informações, que poderiam ser corrigidos com mais tempo de programação, e não na qualidade de recursos audiovisuais, o que garante mérito ao game em entregar uma experiência de jogo com proposta bem definida.

Com uma equipe dedicada e apaixonada por jogos de horror e sobrevivência dos anos 90, o time da Invander Studios lança seu primeiro grande título mais preocupado em prestar uma homenagem ao jogo que deu sentido à vida de seus idealizadores. Mesmo apresentando falhas de execução no gameplay, é inquestionável o conhecimento profundo que a produtora tem de Resident Evil que mostra respeito com o título original além de esforço para entregar um game que será sua assinatura. DayMare 1998 poderá abrir portas para desenvolvimentos mais particulares que consagrará o estúdio como uma equipe competente em survival horror uma vez que trazem em seu histórico a produção de Resident Evil 2 e um tributo apaixonado ainda em busca de identidade.

Nota 7,0

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