Análise | Clair Obscur: Expedition 33 – Uma Obra-Prima Tática que Redefine o RPG por Turnos

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Categoria: Artigos, Games, Review

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Clair Obscur: Expedition 33, lançado em 24 de abril de 2025, é o tipo de jogo que aparece de surpresa e deixa uma marca indelével no coração dos fãs de RPGs. Desenvolvido pela Sandfall Interactive, um estúdio francês formado por ex-funcionários da Ubisoft, e publicado pela Kepler Interactive, este título AA conquistou crítica e público com uma combinação rara de narrativa profunda, combate inovador e uma estética que é pura arte. Disponível para PlayStation 5, Xbox Series X|S e PC (via Steam, Epic Games Store e Xbox Game Pass), o jogo rapidamente se tornou um dos mais aclamados do ano, com nota 92 no Metacritic e avaliações de usuários que o colocam como o mais bem avaliado da história na plataforma, com 9.7/10 baseado em mais de 12 mil reviews.

Como um apaixonado por RPGs desde os anos 90, quando devorava títulos no meu velho PlayStation, confesso que cheguei a Clair Obscur com um misto de curiosidade e ceticismo. Afinal, um estúdio estreante prometendo um RPG por turnos com inspiração em gigantes como Final Fantasy, Persona e até Sekiro? Parecia ousado demais. Mas, após mais de 600 horas de jogo, posso dizer com convicção: Clair Obscur: Expedition 33 não só entrega o que promete, mas vai além, oferecendo uma experiência que é ao mesmo tempo nostálgica e revolucionária. Vamos mergulhar nessa jornada, como se estivéssemos sentados no acampamento da Expedição 33, compartilhando histórias ao redor da fogueira.

1. Uma História que Corta o Coração

Logo de cara, Clair Obscur: Expedition 33 te joga em um mundo onde o tempo é um inimigo cruel. Na ilha de Lumière, inspirada na Belle Époque francesa, a Artífice, uma entidade misteriosa, desperta anualmente para pintar um número em um monólito. Esse número determina a idade das pessoas que, naquele ano, simplesmente viram pétalas e desaparecem no fenômeno chamado “Gommage”. Em 2025, o número é 33, e você assume o papel de Gustave, líder da Expedição 33, a 67ª tentativa de alcançar a Artífice e quebrar esse ciclo mortal.

A narrativa é densa, cheia de camadas emocionais e filosóficas. Ela fala sobre luto, esperança e a efemeridade da vida de uma forma que poucos jogos conseguem. O prólogo já é um soco no estômago, com momentos que me fizeram segurar as lágrimas enquanto tentava entender o peso das escolhas dos personagens. A trama não tem medo de ser sombria, mas equilibra isso com momentos de leveza, como diálogos bem-humorados no acampamento, que constroem laços entre os personagens e o jogador.

O ritmo da história é firme, quase urgente, mas às vezes peca por não dar espaço suficiente para aprofundar certos mistérios. Ainda assim, a coerência temática, centrada na finitude e na persistência humana, faz cada cena carregar um peso emocional que ressoa por horas após desligar o console. O final, com dois desfechos distintos, é simplesmente arrebatador, testando a moralidade dos jogadores e deixando um vazio agridoce que só as grandes histórias conseguem provocar.

2. Um Mundo que Parece uma Pintura Viva

Visualmente, Clair Obscur é um espetáculo. A Sandfall Interactive, com apenas 30 desenvolvedores, criou um mundo que parece saído de uma galeria de arte impressionista. Inspirada no chiaroscuro (ou “clair obscur” em francês), a direção de arte mistura tons quentes e frios, luz e sombra, para criar cenários que são ao mesmo tempo belos e melancólicos. A ilha de Lumière, com seus desfiladeiros tortuosos, torres inclinadas e prados brilhantes, é quase um personagem por si só, testemunhando silenciosamente a tragédia que se repete ano após ano.

Cada canto do mapa é cuidadosamente desenhado, com detalhes que vão de ruínas cobertas de musgo a cidades vibrantes que parecem pulsar com vida. No PS5, onde joguei, o jogo roda em 4K com uma fluidez impressionante, embora tenha notado pequenas quedas de frame em cutscenes mais movimentadas. Nada que comprometa a experiência, mas um lembrete de que este é um título AA, não um AAA com orçamento astronômico. A ausência de um modo foto, porém, é um crime contra um jogo tão bonito.

O design de som complementa perfeitamente os visuais. A trilha sonora, que rivaliza com as melhores de Final Fantasy, é uma mistura de peças orquestrais e corais que elevam a emoção de cada cena. As vozes, com um elenco estelar de dubladores, trazem vida aos personagens, enquanto os efeitos sonoros, como o cantarolar fúnebre que toca quando alguém morre, ficam gravados na memória.

3. Combate: O Coração Pulsante da Expedição

O sistema de combate de Clair Obscur é, sem exagero, um dos melhores que já experimentei em um RPG por turnos. Ele mistura a estratégia clássica do gênero com mecânicas em tempo real, como Quick Time Events (QTEs), esquivas manuais e parrys no estilo Souls. Cada batalha é como uma dança: você precisa aprender o ritmo dos ataques inimigos para bloquear, esquivar ou contra-atacar com precisão. Se não dominar esses timings, prepare-se para morrer – e morrer muito.

No começo, confesso que achei frustrante. Meus reflexos não são os melhores, e as primeiras horas foram marcadas por várias derrotas. Mas, à medida que você entende o ritmo e começa a combinar habilidades, o combate se torna viciante. Cada personagem tem uma classe única, com sinergias que incentivam experimentação. Por exemplo, combinar o ataque elemental de Maelle com o suporte de cura de outro personagem pode virar o jogo contra chefes. A possibilidade de mirar manualmente em pontos fracos dos inimigos adiciona outra camada de profundidade.

A progressão é igualmente recompensadora. Equipamentos como Pictos e Luminas oferecem bônus passivos que permitem personalizar builds, mas os menus de gestão poderiam ser mais intuitivos. Às vezes, me senti perdido com tantas opções, o que pode ser um pequeno obstáculo para novatos. Ainda assim, o sistema é tão bem executado que cada batalha parece uma pequena obra de arte coreografada.

4. Personagens que Ficam na Memória

Os personagens de Clair Obscur são o coração emocional do jogo. Gustave, o líder da expedição, é um protagonista complexo, carregado de culpa e determinação. Maelle, com sua energia vibrante, e outros membros da equipe, como o introspectivo Lune, trazem uma dinâmica que torna cada interação no acampamento um momento especial. As conversas opcionais no acampamento, inspiradas em Breath of Fire, são um destaque, oferecendo vislumbres dos sentimentos e histórias de cada um.

A limitação de escolher apenas três personagens para as batalhas cria um dilema clássico dos RPGs: quem levar? Cada um tem habilidades únicas, e a troca de membros em momentos críticos, como quando todos caem em combate, adiciona uma camada estratégica. A dublagem excepcional e o cuidado com os diálogos fazem você se apegar a esses expedicionários, a ponto de sentir cada perda como se fosse pessoal.

O único ponto fraco é que, por conta do ritmo acelerado da narrativa, alguns personagens secundários não recebem o desenvolvimento que merecem. Ainda assim, a forma como a Sandfall Interactive humaniza seus protagonistas, com momentos de humor e vulnerabilidade, faz deles alguns dos mais memoráveis que já vi em um RPG.

5. Um Mapa Vivo, Mas com Limitações

O mundo de Clair Obscur é um deleite para explorar, com um mapa que mistura áreas lineares com calabouços opcionais e segredos escondidos. Há cidades vibrantes, ruínas misteriosas e bosses opcionais que testam suas habilidades ao limite. No entanto, o mapa tem suas falhas. A falta de ferramentas como marcadores ou anotações dificulta a navegação, especialmente no final do jogo, quando áreas mais abertas são introduzidas.

As áreas opcionais são um dos pontos altos, com puzzles e desafios que recompensam os jogadores mais curiosos. Algumas missões secundárias oferecem até conteúdo narrativo relevante, algo raro em RPGs modernos. Porém, a linearidade da campanha principal pode frustrar quem busca mais liberdade. Ainda assim, o equilíbrio entre exploração e progressão narrativa mantém o ritmo envolvente.

Comparado a outros RPGs, como Xenoblade ou Persona, o mapa de Clair Obscur não é tão expansivo, mas compensa com sua densidade visual e temática. Cada local reflete a tensão entre beleza e tragédia, reforçando a narrativa central. Para um estúdio de 30 pessoas, o nível de detalhe é impressionante.

6. Pequenos Escorregões em uma Jornada Épica

Nenhuma obra é perfeita, e Clair Obscur tem seus tropeços. Além dos menus pouco intuitivos e da falta de ferramentas no mapa, há pequenos problemas técnicos, como quedas de frame em cutscenes e animações fora de combate que parecem menos polidas. Esses detalhes denunciam a natureza AA do jogo, mas nunca chegam a comprometer a experiência como um todo.

Outro ponto que pode dividir opiniões é a dificuldade. O foco em QTEs e ações em tempo real exige reflexos rápidos, o que pode afastar jogadores menos acostumados com mecânicas que lembram Soulslikes. Felizmente, o jogo oferece opções de acessibilidade, como ajustes na dificuldade dos QTEs, o que torna a experiência mais inclusiva.

Apesar dessas falhas, o que Clair Obscur entrega é tão impactante que esses problemas parecem pinceladas tortas em uma tela magnífica. A Sandfall Interactive conseguiu criar um jogo que rivaliza com produções AAA em ambição e qualidade, algo que poucos estúdios estreantes conseguem.

7. Um Legado que Já Nasce Clássico

Clair Obscur: Expedition 33 é mais do que um RPG por turnos; é uma carta de amor ao gênero, escrita com paixão e executada com maestria. Ele pega o que há de melhor em clássicos como Final Fantasy e Persona, adiciona um toque moderno com mecânicas em tempo real e embrulha tudo em uma narrativa que faz você refletir sobre a vida, a morte e os laços que nos unem. A Sandfall Interactive, com sua equipe pequena, prova que jogos AA podem ser tão impactantes quanto os gigantes da indústria.

Com mais de 2 milhões de cópias vendidas em menos de duas semanas e uma recepção calorosa em fóruns como Reddit, onde jogadores o chamam de “obra-prima moderna”, Clair Obscur já se consolidou como um forte candidato ao Jogo do Ano de 2025. O impacto cultural do jogo, elogiado até pelo presidente francês Emmanuel Macron, mostra que ele transcende o entretenimento e toca em algo mais profundo.

Se você é fã de RPGs, este é um título obrigatório. Se nunca jogou um RPG por turnos, Clair Obscur é a porta de entrada perfeita, com uma história que emociona, um combate que desafia e um mundo que encanta. Terminei minha jornada com a Expedição 33 com lágrimas nos olhos e um sorriso no rosto, sabendo que vivi algo especial. Agora, é sua vez de embarcar nessa aventura. Prepare-se para rir, chorar e lutar como se sua própria vida dependesse disso.

Nota: 9.5

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